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Fiz ranger as folhas de jornal abrindo-lhes as pálpebras piscantes. E logo de cada fronteira distante subiu um cheiro de pólvora perseguindo-me até em casa. Nestes últimos vinte anos nada de novo há no rugir das tempestades. Não estamos alegres, é certo, mas também por que razão haveríamos de ficar tristes? O mar da história é agitado. As ameaças e as guerras havemos de atravessá-las, rompê-las ao meio, cortando-as como uma quilha corta as ondas.

O que esperamos na ágora reunidos? É que os bárbaros chegam hoje. Por que tanta apatia no senado? Os senadores não legislam mais? É que os bárbaros chegam hoje. Que leis hão de fazer os senadores? Os bárbaros que chegam as farão. Por que o imperador se ergueu tão cedo e de coroa solene se assentou em seu trono, à porta magna da cidade? É que os bárbaros chegam hoje. O nosso imperador conta saudar o chefe deles. Tem pronto para dar-lhe um pergaminho no qual estão escritos muitos nomes e títulos. Por que hoje os dois cônsules e os pretores usam togas de púrpura, bordadas, e pulseiras com grandes ametistas e anéis com tais brilhantes e esmeraldas? Por que hoje empunham bastões tão preciosos de ouro e prata finamente cravejados? É que os bárbaros chegam hoje, tais coisas os deslumbram. Por que não vêm os dignos oradores derramar o seu verbo como sempre?

"Vem por aqui" — dizem-me alguns com os olhos doces Estendendo-me os braços, e seguros De que seria bom que eu os ouvisse Quando me dizem: "vem por aqui!" Eu olho-os com olhos lassos, (Há, nos olhos meus, ironias e cansaços) E cruzo os braços, E nunca vou por ali... A minha glória é esta: Criar desumanidades! Não acompanhar ninguém. — Que eu vivo com o mesmo sem-vontade Com que rasguei o ventre à minha mãe Não, não vou por aí! Só vou por onde Me levam meus próprios passos... Se ao que busco saber nenhum de vós responde Por que me repetis: "vem por aqui!"? Prefiro escorregar nos becos lamacentos, Redemoinhar aos ventos, Como farrapos, arrastar os pés sangrentos, A ir por aí... Se vim ao mundo, foi Só para desflorar florestas virgens, E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada! O mais que faço não vale nada. Como, pois, sereis vós Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem Para eu derrubar os meus obstáculos?... Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós, E vós amais o que é fácil! Eu amo o Longe e a Miragem, Amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Vai, livro natimudo, E diz a ela Que um dia me cantou essa canção de Lawes: Houvesse em nós Mais canção, menos temas, Então se acabariam minhas penas, Meus defeitos sanados em poemas Para fazê-la eterna em minha voz Diz a ela que espalha Tais tesouros no ar, Sem querer nada mais além de dar Vida ao momento, Que eu lhes ordenaria: vivam, Quais rosas, no âmbar mágico, a compor, Rubribordadas de ouro, só Uma substância e cor Desafiando o tempo. Diz a ela que vai Com a canção nos lábios Mas não canta a canção e ignora Quem a fez, que talvez uma outra boca Tão bela quanto a dela Em novas eras há de ter aos pés Os que a adoram agora, Quando os nossos dois pós Com o de Waller se deponham, mudos, No olvido que refina a todos nós, Até que a mutação apague tudo Salvo a Beleza, a sós.

Não sou nada. Nunca serei nada. Não posso querer ser nada. À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo. Janelas do meu quarto, Do meu quarto de um dos milhões do mundo. que ninguém sabe quem é ( E se soubessem quem é, o que saberiam?), Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente, Para uma rua inacessível a todos os pensamentos, Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa, Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres, Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens, Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada. Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade. Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer, E não tivesse mais irmandade com as coisas Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada De dentro da minha cabeça, E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida. Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu. Estou hoje dividido entre a lealdade que devo À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora, E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro. Falhei em tudo. Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada. A aprendizagem que me deram, Desci dela pela janela das traseiras da casa.

Abril é o mais cruel dos meses, germina Lilases da terra morta, mistura Memória e desejo, aviva Agônicas raízes com a chuva da primavera. O inverno nos agasalhava, envolvendo A terra em neve deslembrada, nutrindo Com secos tubérculos o que ainda restava de vida. O verão; nos surpreendeu, caindo do Starnbergersee Com um aguaceiro. Paramos junto aos pórticos E ao sol caminhamos pelas aléias de Hofgarten, Tomamos café, e por uma hora conversamos. Big gar keine Russin, stamm aus Litauen, echt deutsch. Quando éramos crianças, na casa do arquiduque, Meu primo, ele convidou-me a passear de trenó. E eu tive medo. Disse-me ele, Maria, Maria, agarra-te firme. E encosta abaixo deslizamos. Nas montanhas, lá, onde livre te sentes. Leio muito à noite, e viajo para o sul durante o inverno. Que raízes são essas que se arraigam, que ramos se esgalham Nessa imundície pedregosa? Filho do homem, Não podes dizer, ou sequer estimas, porque apenas conheces Um feixe de imagens fraturadas, batidas pelo sol, E as árvores mortas já não mais te abrigam, nem te consola o canto dos grilos, E nenhum rumor de água a latejar na pedra seca. Apenas Uma sombra medra sob esta rocha escarlate. (Chega-te à sombra desta rocha escarlate), E vou mostrar-te algo distinto De tua sombra a caminhar atrás de ti quando amanhece Ou de tua sombra vespertina ao teu encontro se elevando; Vou revelar-te o que é o medo num punhado de pó.

Turvo turvo a turva mão do sopro contra o muro escuro menos menos menos que escuro menos que mole e duro menos que fosso e muro: menos que furo escuro mais que escuro: claro como água? como pluma? claro mais que claro claro: coisa alguma e tudo (ou quase) um bicho que o universo fabrica e vem sonhando desde as entranhas azul era o gato azul era o galo azul o cavalo azul teu cu tua gengiva igual a tua bocetinha que parecia sorrir entre as folhas de banana entre os cheiros de flor e bosta de porco aberta como uma boca do corpo (não como a tua boca de palavras) como uma entrada para eu não sabia tu não sabias fazer girar a vida com seu montão de estrelas e oceano entrando-nos em ti bela bela mais que bela mas como era o nome dela? Não era Helena nem Vera nem Nara nem Gabriela nem Tereza nem Maria Seu nome seu nome era… Perdeu-se na carne fria perdeu na confusão de tanta noite e tanto dia.

Meia-noite cava, quando, exausto, eu meditava Nuns estranhos, velhos livros de doutrinas ancestrais E já quase adormecia, percebi que alguém batia Num soar que mal se ouvia, leve e lento, em meus portais. Disse a mim: "É um visitante que ora bate em meus portais´- É só isto, e nada mais." Ah! tão claro que eu me lembro! Era um frio e atroz dezembro E as chamas no chão, morrendo, davam sombras fantasmais, E eu sonhava logo o alvor e pra acabar com a minha dor Lia em vão, lembrando o amor desta de dons angelicais A qual chamam Leonora as legiões angelicais, Mas que aqui não chamam mais. E um sussurro triste e langue nas cortinas cor de sangue Assustou-me com tremores nunca vistos tão reais, E ao meu peito que batia eu mesmo em pé me repetia: "É somente, em noite fria, um visitante aos meus portais Que, tardio, pede entrada assim batendo aos meus portais. É só isto, e nada mais. Neste instante a minha alma fez-se forte e ganhou calma E "Senhor" disse, ou "Senhora, perdoai se me aguardais, Que eu já ia adormecendo quando viestes cá batendo, Tão de leve assim fazendo, assim fazendo em meus portais Que eu pensei que não ouvira" - e abri bem largo os meus portais: - Treva intensa, e nada mais. Longamente a noite olhei e estarrecido me encontrei, E assustado, tive sonhos que ninguém sonhou iguais, Mas total era o deserto e ser nenhum havia perto Quando um nome, único e certo, sussurrei entre meus ais - - "Leonora" - esta palavra - e o eco a repôs entre meus ais. E isto é tudo, e nada mais.

Trinta convidados — escritores, críticos, professores, jornalistas — responderam, entre obras poéticas conhecidas, quais são os melhores poemas de todos os tempos. Cada participante poderia indicar entre um e dez poemas. Nenhum autor poderia ser citado mais de uma vez. 69 poemas foram indicados, mas destes apenas 23 tiveram mais de três citações. São eles: “O Cão Sem Plumas” e “Morte e Vida Severina”, de João Cabral de Melo Neto; “Campo de Flores” e “A Máquina do Mundo”, de Carlos Drummond de Andrade; “Romanceiro da Inconfidência”, de Cecília Meireles; “Via Láctea”, de Olavo Bilac; “Canção do Exílio”, de Gonçalves Dias; “Romanceiro Gitano”, de Federico García Lorca; “Poema do Fim”, de Marina Tzvietáieva, “Nalgum Lugar em que Nunca Estive”, de e. e. cummings; “Anabase”, de Saint-John Perse; “A Divina Comédia’, de Dante Alighieri; “Funeral Blues”, de W.H. Auden; “O Corvo”, de Edgar Allan Poe; “Terra Desolada”, de T.S. Eliot; “Tabacaria”, de Fernando Pessoa; “Poema Sujo”, de Ferreira Gullar; “Cântico Negro”, de José Régio; “À Espera dos Bárbaros”, de Konstantinos Kaváfis; “E Então, Que Quereis?...”, de Vladímir Maiakóvski; “Os Estatutos do Homem”, de Thiago de Mello, e “Hugh Selwyn Mauberly”, de Ezra Pound. Abaixo, a lista baseada no número de citações. Três poetas brasileiros estão na lista: Carlos Drummond de Andrade, Ferreira Gullar e Thiago de Mello.